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OSCAR ARARIPE

AS FLORES DE OSCAR ARARIPE

Pocas entre as inumeráveis formas de vida que acompanham a aventura humana na Terra alcançaram a presença simbólica das flores, e isso desde a noite dos tempos. Como as pedras preciosas entre as formações inorgânicas, as flores se nos revelam como as criações esteticamente mais altas do fenômeno vital, acrescentando a seu encanto o encanto oposto ao daquelas, ou seja, a sua extrema brevidade no tempo, ao contrário da incomensurável duração dos minerais e das gemas. Símbolos da vida, que através delas se espalha no reino vegetal, são igualmente símbolos da morte, por acompanharem os homens em sua última viagem, desde as mais remotas civilizações. Na Idade Média, período onde a simbologia alcançou requintes inéditos, foram elas elevadas a elementos caracterizadores de santos e de reis, de exércitos e de povos.

És a partir das flores que se constrói a sutilíssima arte de Oscar Araripe, um dos poucos artistas brasileiros a alcançar o difícil equilíbrio entre a exatidão e a leveza. Suas flores, ou melhor, suas naturezas-mortas onde os vasos de flores assumem o papel central, são ao mesmo tempo puras formas e puras flores. As toalhas que sustentam tais vasos quase imateriais, que atravessam às vezes a transparência dos mesmos, são formas puras igualmente, ou ondas, os reflexos horizontais da quase verticalidade dos caules, ou pequenas esferas luminosas, translúcidas. Vez ou outra, uma paisagem inspirada na perfeita harmonia das cidades setecentistas de Minas evoca-nos o grande Guignard, apaixonado, como Oscar Araripe, por essa ambiência específica, que alcança uma harmonia entre o natural e o arquitetônico única na visualidade brasileira. Mais do que tudo, no entanto, as flores dos seus quadros são como borboletas, as suas pétalas são asas, e não sabemos se as flores são borboletas pousadas nos caules ou se as borboletas são flores que passaram a voar. A bidimensionalidade dominante em seus quadros remete-nos, por outro lado, a algo da pintura oriental, a pintura desse Extremo Oriente onde o sentido da natureza ritmava e conduzia todas as coisas. O que domina fulcralmente a sua pintura, no entanto, é um cromatismo muito característico, um cromatismo eternamente diverso e invariavelmente único, que cria o amálgama formal de todos esses elementos.

É con grande orgullo que a Galeria Manuel Bandeira acolhe, portanto, a presente mostra desse grande artista brasileiro, pleno de vitalismo e de autenticidade, esta autenticidade que talvez seja a mais importante, ainda que tão rara, postulação de qualquer artista verdadeiro.

Alexei Bueno, poeta e escritor, curador da Galeria Manuel Bandeira, da ABL.

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